Por Daubert Gonçalves*
2 – OS BONZINHOS
É necessário compreender que estes dois primeiros textos da série “Qual tipo de empresária ou empresário você é?” são, assim como os demais serão, sugestões de desconstrução de estereótipos de defesa. Também é preciso refletir por qual motivo algumas empresárias e empresários precisam tanto se defender atrás de máscaras de conveniência.
A prerrogativa sine qua non de empresárias e empresários é a coragem. Sim! Coragem de abrir uma empresa e arcar com todas as responsabilidades além de centenas de milhares de cobranças diárias quando não noturnas. Se a coragem é característica básica de empresárias e empresários, por qual motivo tentar se esconder?
Os chamados “bonzinhos” assumem esta postura por, principalmente, se convencer que é tão, senão mais, importantes que os demais seres da sociedade. Com isso as caras e bocas elaboradas para quem os aborda são unicamente para serem reconhecidos como úteis em algum lugar e para alguém como, por exemplo, para seus funcionários se “orgulharem” de trabalhar para uma “divindade” de bondade.
Com este comportamento a boazinha ou o bonzinho iniciam seu processo de aliciamento com os mais diversos “pedidos” pois é muito difícil para o(a) “coagido(a)” dizer não para quem é “tão boa” ou “tão bom”.
As empresárias ou empresários que possuem essa característica utilizam fala suave e mansa, postura frágil como a personagem Dolores Umbridge, ministra da magia do filme A Ordem da Fênix da série Harry Potter mas tão cruéis também como a personagem que ataca seus subordinados, fornecedores e prestadores de serviço que normalmente se “desarmam” diante da postura “agradável”. Quando em uma negociação franca normalmente utilizam a frase “Ahhhh… eu não sei bem” ou algo do gênero para se valorizar mediante a necessidade dos funcionários, fornecedores e prestadores de serviço.
Se enxergam como o poço de distribuição de bondade levando amor e esperança para todos ao seu lado. Buscam atenção incondicional pois esta é o combustível para encontrarem motivo para continuar. Vejam, é um círculo muito delicado de “roubo de energia”, muito sutil ao ponto dos mais atentos serem envolvidos e até recomendarem para outros colegas de profissão e pessoais como se fosse um exemplo a ser seguido pela humanidade. Na verdade, as “boazinhas” e os “bonzinhos” buscam isso mesmo, serem o espelho da sociedade enquanto trocam descontos e serviços como se fossem obrigações e favores que recompensam sua atitude divina na sociedade.
Vocês já ouviram a expressão “Por fora bela viola, por dentro pão bolorento”?
Esta é a reflexão para quem encontra em si estas características. Em que está atrelada a necessidade de demonstrar para a sociedade ao entorno de serem boazinhas ou bonzinhos?
A reposta é aceitação.
Estes seres “diferentes” normalmente estão envolvidos em grupos e associações beneficentes pois, como já dito, precisam ser reconhecidos como divindades da bondade e serem aceitos como tal. Estão em clubes de serviços, entidades religiosas, associações sem fins lucrativos**, grupos beneficentes das mais diferentes espécies, anjos da noite, sopa da madrugada e outros.
O principal problema que levam para dentro das suas empresas é que, mesmo a contabilidade e o financeiro indicando um gráfico negativo, fazem doação de qualquer peça, produto ou serviço para os grupos que fazem parte ou que chegam até eles mas só conseguem continuar desta forma por explorar impiedosamente suas funcionárias e funcionários, fornecedores, prestadores de serviços e amigas e amigos que sempre observam dificuldades na empresa, na vida pessoal das “boazinhas” e “bonzinhos”, prestam ajuda mas o “problema” nunca é resolvido.
Diante deste quadro as “boazinhas” e “bonzinhos” mantém a “cara de pet” magoado sempre à demonstração. Vocês lembram da vitimização das “mendigas” e “mendigos” do texto passado? A intensidade nestas divindades da bondade é de convenção pois ao invés de pedirem para si, sempre colocam terceiros como motivo.
Vou exemplificar:
Prestei assessoria para uma empresa onde os principais envolvidos (um casal) possuíam a característica de “boazinha” e “bonzinho”. Os fornecedores e prestadores de serviços sempre ficavam em quarto ou quinto plano pois o dinheiro da empresa sempre tinha que suprir a primeira necessidade de manter o entorno, ou seja, as finanças da instituição eram totalmente voltadas para manter as aparências através da filantropia pois, na mente deles, manter suas ações beneficentes na sociedade justificavam o rombo que criavam no caixa. O malabarismo se complicava pois, com exceção da empresa de água e de energia elétrica, não mantinham uma carteira de fornecedores confiáveis e constantes pois simplesmente devia para todos que estavam na carteira e passavam a dever para os novos sendo obrigados a procurar fornecedores cada vez mais distantes. Como o cadastro sempre era novo havia a obrigação de pagar à vista mas, para serem reconhecidos como o “casal bondade”, vendiam com prazo de trinta e até sessenta dias. Para manter este “plano mirabolante” fustigavam a boa vontade das funcionárias e funcionários tanto na exploração do período de trabalho, que sempre era maior que o “combinado” como pelos atrasos de pagamento dos próprios vencimentos da equipe. Nos dias que qualquer pessoa se negava a atender as “necessidades” da empresa a cara de poucos amigos no dia seguinte era inevitável beirando o assédio moral.
O fim desta história foi que, não fosse a programação que instituí no financeiro, também teriam atrasado o pagamento da assessoria pois, pasmem, chegaram a conversar comigo para que o pagamento semanal passasse a ser mensal pela dificuldade que ultrapassavam mas a distribuição de cobertores nunca parou, o dízimo da instituição religiosa que faziam parte nunca atrasou, a compra do supermercado para o alimento aos carentes nunca falhou entre outras ações de cunho beneficente jamais poderiam ser interrompidas pois a necessidade de aceitação é maior que o compromisso com as obrigações da empresa.
E aí?
Você está “violentando” sua empresa para ser reconhecida ou reconhecido como seres divinos da bondade na sociedade?
Está desviando recursos importantes da sua empresa para satisfazer seu ego?
Continua fustigando funcionárias ou funcionários para manter sua casca brilhante?
Se pelo menos uma destas respostas foi sim, cuidado, a possibilidade de você não ter empresa em menos de um ano é muito grande.
Qual o remédio: Para quem trabalha com algum “boazinha ou bonzinho”: arrume outro emprego. Para quem é prestador de serviço ou fornecedor o mesmo do anterior: Cliente ruim você deixa para a concorrência.
Se você achou o texto engraçado é porque conhece alguém com este perfil mas, se você ficou irritada ou irritado com o texto é porque possivelmente é uma empresária “boazinha” ou empresário “bonzinho”. Se quiser mudar isso, me procure que te corrijo mas, de você cobro por semana e adiantado.
Até o próximo “Que tipo de empresária ou empresário você é?”
*Daubert Gonçalves é Graduado em Gestão Pública, MBA em Administração Pública e Gerência de Cidades, MBA em Ciências Políticas, Bacharelando em Administração Pública e Auditor Interno ISO 9001/15.
** Entidades sem fins lucrativos não são aquelas que funcionam sem dinheiro, mas as que não apresentam lucro ao final do ano fiscal. Traduzindo, em termos práticos e pouco técnicos, podem movimentar milhões durante o ano e apresentar um balanço com zero no final deste período que “se confirma” como sem fins lucrativos.